Foto 1: Ciranda na Oficina realizada com as mulheres da Associação Flores do Campo.
Fonte: INCT Odisseia, Sítio Santarém (2023)
Quais são os fatores que contribuem para a resiliência e sustentabilidade das organizações de mulheres rurais? Como e por que as agricultoras se reuniram em coletivos de mulheres? O que leva esses grupos a se interessarem pela Agroecologia? Essas e outras perguntas estiveram presentes na primeira oficina de Sistematização de Experiências realizadas entre Pesquisadoras do Projeto INCT Odisseia e as Mulheres da Associação Flores do Campo, em Mojuí dos Campos, no dia 14 de março. A Sistematização de Experiências é uma metodologia que busca favorecer a construção de conhecimentos coletivos, a partir das práticas sociais e tem um grande potencial na pesquisa científica.
A associação Flores do Campo começou a ser pensada em 2015 quando as mulheres da comunidade Terra Preta dos Lúcios se reuniam para trocar experiências, fortalecer suas práticas e buscar novos conhecimentos e aprendizagens através de cursos e projetos. Perceberam que unidas elas conseguiam ir mais longe e isso fez toda a diferença, quando começaram a ver a soja se aproximando de sua comunidade. Preocupavam-se com as ameaças das pulverizações massivas de agrotóxicos que forçavam famílias a se esconderem dentro de casa, ao mesmo tempo que a invasão dos insetos nos roçados acontecia de uma forma nunca vista. Crescia o temor sobre os impactos na saúde das crianças e idosos e sobre a continuidade da produção agrícola dos pequenos agricultores. Assim, pela necessidade de se fortalecerem mutuamente, pela consciência de que não gostariam de usar agrotóxicos em seus plantios e de que precisavam buscar alternativas para isso, pela esperança de melhorar a produção e comercialização das hortaliças, as mulheres de Terra Preta dos Lúcios se organizaram e oficializaram seu engajamento em uma associação, em 2017.
Foto 2 – Oficina de Sistematização de Experiências com Pesquisadoras e Mulheres da Associação Flores do Campo em Mojuí, março de 2023
Fonte: INCT Odisseia, Sítio Santarém (2023)
De lá para cá vivenciaram muitas experiências impactantes, muitas histórias de vitórias, mas também de aprendizados difíceis para essas mulheres quando buscaram se inserir na política pública do PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar).
Uma das histórias impactantes aconteceu no período da pandemia do COVID19. Grande parte dos domicílios no município de Mojuí dos Campos tem as mulheres como chefes de família. Com o agravamento da pandemia as mulheres não podiam mais comercializar sua produção nas feiras, poucos atravessadores chegavam para comprar a produção e os pequenos trabalhos informais ficaram inacessíveis. Dessa forma, os lares que já enfrentavam uma situação de grave vulnerabilidade econômica e social viram a fome entrar e se instalar. Em função de sua capacidade de articulação, mobilização e autogestão, a Associação Flores do Campo foi indicada para executar um projeto financiado pela Fundação Banco do Brasil de distribuição de cestas de alimentos a famílias vivendo em situação de grande vulnerabilidade. Por meio de novas parcerias, as Flores do Campo passaram também a entregar botijões de gás, além das cestas básicas. Em alguns lares, era a única comida que chegava às mesas. Havia também famílias que não usavam o gás de cozinha a mais de 4 meses. Todas se emocionaram com o relato sobre uma mulher que se ajoelhou para agradecer a elas pela chegada do alimento e do gás.
A decisão de que as Flores do Campo seriam a porta de entrada dessas cestas básicas tinha a ver também com a preocupação do financiador de que não houvesse uso político das entregas. E assim as Flores do Campo ocuparam um lugar de destaque, mas principalmente, demonstraram a importância do capital social que elas representam no município.
Assim, a oficina de sistematização permitiu co-construir a percepção sobre o quanto essas mulheres já caminharam – a despeito de todas as suas vulnerabilidades e tocou em alguns pontos relevantes que podem ser o ponto de partida para novas pesquisas na região dentre eles: a importância da coesão, confiança e das relações familiares e de amizade para a sustentabilidade dos grupos de mulheres; as barreiras individuais e coletivas para a alternância de poder nos grupos de mulheres, sobrecarregando as lideranças pioneiras e afetando a sua resiliência; e a agroecologia como forma de resistência e de re-existência dos grupos de mulheres na Amazônia.
Foto 3: Associada das Flores do Campo em sua horta agroecológica
Fonte: INCT Odisseia, Sítio Santarém (2019)